19 de nov. de 2009

A matemática das calorias

Um relatório ainda em estágio de rascunho preparado pelo Conselho Científico de Nutrição do Reino Unido sugere que a recomendação diária de ingestão calórica aumente em 16%. Na análise dos conselheiros, 2500 calorias é pouco para pessoas fisicamente ativas, como eles acreditam que são os britânicos. Como era de esperar, o controverso relatório andou desagradando nutricionistas de outros lugares. Um artigo do Examiner.com diz que esse negócio de contar calorias só serve mesmo para a indústria declarar a informação nutricional de seus produtos e nos convencer de que não engordam. Segundo a autora, quem consegue se basear na ingestão calórica diária recomendada (2000 calorias para mulheres e 2500 para homens) são aqueles que consomem produtos industrializados – que normalmente não são os mais saudáveis. Quem tem uma alimentação mais baseada em itens in natura encontrados na feira não leva para casa informação nutricional nenhuma e não tem muita noção de quantas calorias irá comer. O mesmo acontece, diz a articulista, com quem come em restaurantes, já que as estimativas de teor calórico nos cardápios costumam errar em 30% a 40%, segundo ela. Quer dizer, saber qual é o limite saudável de calorias na alimentação não estaria nos ajudando muito.

Mas a questão principal é se a atividade física nos autoriza a comer mais, como afirma o relatório.

Recentemente, a revista Time e o jornal The New York Times publicaram reportagens sobre um suposto mito: que o exercício emagrece. Nas duas matérias, são mencionados estudos segundo os quais, ao contrário do que se acreditava, adotar uma rotina de exercícios físicos não basta para a perda de peso. E aí vinham histórias de pessoas que suavam à beça na sua malhação intensa e continuavam acima do peso. Descobria-se que essas pessoas não estavam emagrecendo porque... continuavam comendo além da conta. Lógico!

Qual é o sentido de sair da academia e meter as caras numa pizza ou numa musse de chocolate? Pois era isso que os entrevistados andavam fazendo. Se o exercício não emagrece, é porque a matemática das calorias sempre pesa mais do lado da comida. Ou seja, se as pessoas realmente prestassem atenção aos números, saberiam que aquela aula de step que deixa a cara vermelha e a roupa ensopada gasta menos calorias do que tem a pizza que iriam comer em seguida.

A regra para emagrecer segue a matemática. É preciso gastar mais do que ingerimos. Tirar mais do estoque e repor menos. Exercício emagrece? Depende do que você come, oras. Qual o melhor exercício para ajudar a emagrecer? Aquele que você faz e não abandona, como eu já disse numa matéria da revista.

Será mesmo que os britânicos ou qualquer outra nação estão se exercitando tanto que precisam comer mais do que 2500 calorias? Pode até ser que as pessoas mais ativas precisem mesmo de uma alimentação mais calórica do que se acreditava. Eu mesma fui orientada por uma nutricionista a comer mais de 3000 calorias diárias, mas essa não é uma recomendação muito comum em tempos de obesidade. A mim parece mais provável que um número crescente de pessoas no mundo inteiro já esteja comendo bem mais do que as 2000 ou 2500 calorias, desobedecendo a recomendação atual, e sem se exercitar o bastante.

A questão que se levanta dessa história toda é se estamos sabendo nos guiar pelas recomendações para calibrar nossa atividade física e nossa alimentação diária conforme o funcionamento do nosso corpo. Se eu comer 2000 calorias e continuar malhando como sempre, eu emagreço. Se o ultramaratonista Dean Karnazes comesse 2500 calorias, jamais seria capaz de correr as centenas de quilômetros das provas mais ousadas. As recomendações que os nutricionistas publicam servem para médias populacionais, não para casos particulares. Cabe a cada pessoa – com ajuda profissional, de preferência – avaliar quanto está gastando e quando deve repor ao seu estoque.

(Orininalmente publicado em www.epoca.com.br)

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