Sempre duvidei dessas propagandas que
mostram pessoas sorridentes se exercitando na sala, na cozinha, no
jardim. Normalmente há uma geringonça envolvida na história, e
atribui-se a ela a incrível e repentina boa forma da pessoa no vídeo.
Será que a presença de uma maquininha “milgrosa” dentro de casa é
suficiente para um sedentário se transformar num malhador voraz?
Anos atrás, conheci uma adolescente gorda que resolveu tentar
emagrecer comprando uma esteira ergométrica. Ela pôs aquele trombolho
enorme no quarto dela e, diante do monstro, sentia-se forçada a caminhar
sobre ele diariamente por pelo menos meia hora. Eu era amiga da irmã
dela – que também estava um pouco acima do peso, mas demorou bem mais a
tomar providências – e visitava o apartamento com frequência. Por algum
tempo, pelo menos, sei que a garota manteve o hábito de se exercitar na
esteira. Mas seus hábitos alimentares eu não vi mudar muito. Com a mãe
quituteira – e também fora de forma – que ela tinha, deixar de comer
guloseimas calóricas parecia um pouco mais difícil.
Um pouco mais tarde, convivi com uma jovem que tinha seus
segredinhos. A maioria das meninas do pensionato dependiam do dinheiro
dos pais para se sustentar na capital enquanto cursavam a faculdade e
quase ninguém tinha grana pra academia. Mas aquela estudande de direito
exibia umas coxas fortes invejáveis e um abdome duro que só muita
ginástica seria capaz de garantir. Depois de algumas conversas na
cozinha, ela contou que fazia seus agachamentos e seus abdominais ali
mesmo ao lado da cama, nos momentos em que sua companheira de quarto
estava ausente. Fiquei admirada com a determinação daquela moça.
Aparentemente, a ginástica solitária funcionava perfeitamente para ela.
Mas isso não funciona com todo mundo. Uma amiga com quem dividi
apartamento algum tempo depois se animou muito com uma dessas
propagandas de TV e comprou um aparelho que supostamente ajuda a fazer
exercícios abdominais no colchonete. Tudo que o aparelho faz, na
verdade, é ajustar a postura do tronco, fixando a posição do pescoço e
das mãos. A vontade de se exercitar continua vindo da pessoa mesmo.
Minha amiga guardava o aparelho debaixo da cama, e ali ele ficava a
maior parte do tempo. Não eram muito frequentes as vezes em que ela
tomava a iniciativa de tirá-lo de lá.
Além
dessas histórias que presenciei, já vi e ouvi falar de vários
equipamentos de fitness acabaram rebaixados à função de cabide. Nem todo
mundo consegue se manter motivado a fazer exercícios sozinho, por conta
própria, sem ninguém para dar uma mãozinha. Eu mesma nunca fui boa
nisso. Tentei algumas vezes, em períodos de vacas magras, mas só
conseguia correr na rua ou pedalar. Agachamentos e abdominais no tapete
da sala? Era tentar uma vez e desistir.
Um jeito
que me parece bacana de entrar em forma fora de uma academia é o que eu
venho acompanhando há alguns meses. Uma pessoa bem próxima de mim era
sedentária até seis ou sete meses atrás. A convite de um amigo que
estava precisando mudar de vida – e de um incentivo – , aceitou começar a
corrrer no parque duas vezes por semana. O amigo se lembrava de uma
série de exercícios que havia aprendido numa academia algum tempo antes,
e os dois passaram a executá-los no setor de equipamentos rústicos do
parque. Rústicos porque são pedaços de troncos de árvores e tábuas de
madeira imitando as barras e bancos de uma sala de musculação. A
parceria durou cerca de dez sessões, e o amigo desistiu. Voltou para a
velha vida de sempre e abandonou aquele que o havia incentivado.
O incrível foi
que esse cara que eu conheço bem não desistiu. Sem o amigo, continuou
correndo e fazendo musculação rústica no parque com uma assiduidade
admirável. No começo, ia de manhã. Mas logo percebeu que estava difícil
acordar cedo e transferiu a malhação para o começo da noite, depois do
trabalho. Depois de uns três meses, lá fui eu dar palpite. Disse que
aquela série de exercícios que ele havia aprendido, por melhor que fosse
(eu não sei se era boa), não deveria durar para sempre. Era preciso
variar as séries de tempos em tempos (uma quebra indicada para
iniciantes é a cada três meses), senão o corpo se acostuma e os
resultados vão diminuindo. Que tal se ele procurasse algum tipo de
orientação profissional? Nem que fosse um livro ilustrado que desse
indicações de exercícios e da execução corrreta...
Eu não imaginava que minha sugestão cairia tão bem. Eu sabia que esse
cara odiava a ideia de entrar numa academia ou contratar um personal
trainer. Ele tinha preconceitos demais para aderir ao mundinho fitness.
Mas ele gostou da ideia de ser orientado para não perder os resultados
que havia conquistado. Com sua rotina solitária no parque, ele já havia
perdido quatro quilos, já exibia contornos mais bonitos nos braços e já
começava a ver gomos se formando no abdome. Imagine o que ele
conseguiria com um professor.
Indiquei um
profissional da academia que eu frequentava mesmo, só pra ele conversar.
Eles combinaram a primeira conversa no parque mesmo e foram com a cara
um do outro. O professor observou como ele fazia os exercícios e propôs
algumas alterações. Meu amigo seguiu se exercitando sozinho com as novas
dicas. Os encontros com o professor eram esporádicos e serviam para
ajustar o treino. Algumas sessões depois, meu amigo ganhou planilhas de
corrida e aprendeu exercícios mais avançados. Ao perceber que, com a
ajuda do professor, ele tinha mais garra para terminar as séries e podia
avançar nas técnicas muito rapidamete, na medida em que o professor via
que ele melhorava, meu amigo resolveu contratá-lo para sessões
semanais. Na quarta-feira ele recebe todo o incentivo e a orientação de
que precisa, e em outros dois dias na semana faz tudo por conta própria.
Cada pessoa tem seu jeito de lidar com a
própria vontade e com a própria preguiça. Eu só consigo fazer ginástica
se tiver um lugar com um professor para frequentar, com pessoas para
bater papo e me distrair. Há pessoas que, mesmo para atividades
solitárias como a natação, só permanecem motivadas quando se veem como
parte de um time. Se você é do tipo que desiste rápido, para que se
enganar comprando uma máquina que vai juntar pó no canto da sala?
Automotivação é fundamental para entrar e ficar em forma. Sem ela, eu
não iria religiosamente à academia há 17 anos. Mas é preciso saber a que
somos capazes de nos motivar e buscar os recursos necessários para
transformar a intenção em hábito indispensável.
(Originalmente publicado em www.epoca.com.br)
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