Um professor-fonte-guru que tive na academia há alguns anos me
ensinou que a gente deve colocar a prática física logo no primeiro
horário disponível que tiver no dia, para não correr o risco de ir
deixando pra depois e, no fim do dia, desistir em nome do cansaço ou da
preguiça. Por causa disso, elegi a manhã como horário preferencial para
minha rotina de exercícios. Apesar do sono que acumulo ao longo da
semana (no sábado, ai de quem quiser me tirar da cama antes das 10h!),
prefiro acordar cedo e cumprir meu programa na academia antes de ir ao
trabalho.
O problema é levantar às 7h quando o dia
anterior foi exaustivo. Esta semana me aconteceu isso. Tive dois dias
consecutivos totalmente atípicos, com viagem de avião, festa até tarde,
taças de espumante, noite curta em hotel, telefonema fora de hora, falta
de táxi, estresse com a chuva e o trânsito, voos atrasado,
transferência de aeroporto, chegada tardia ao trabalho, pressa, falta de
descanso. Na manhã seguinte, quem disse que meu corpo se movia? Já eram
8h30 e minhas pernas não pareciam prontas para sair da cama. E então
veio a dúvida inevitável: vou ou não vou? Fazer um esforço extra para
levantar, tomar meu café da manhã rapidamente, correr para a academia e
chegar um pouco mais tarde ao trabalho (felizmente eu tenho horários
maleáveis aqui na revista) valeria a pena? Ou eu iria me beneficiar mais
se, em vez de fazer força nas máquinas da sala de musculação, ficasse
dormindo e passasse mais um dia (já tinha passado dois na semana) sem
exercícios?
Eu não tinha a resposta, mas meu corpo só me
deixou começar o dia às 9h30. Aparentemente, descansada. Já era um tanto
tarde demais para seguir a rotina de sempre
(café-academia-banho-trabalho), então decidi que inverteria a ordem e
deixaria os exercícios para depois do expediente. Enquanto isso, eu
tentaria descobrir qual exercício deveria fazer naquele dia.
Quem
me deu a resposta foi o fisiologista Claudio Pavanelli, numa conversa
por telefone. Ele me confirmou algumas coisas que eu já sabia. Disse que
é durante o descanso que o corpo colhe os benefícios da atividade
física. “A gente sai da academia pior do que entrou”, disse Pavanelli.
Ele quis dizer o seguinte: o exercício gasta energia, consome
nutrientes, libera resíduos tóxicos, causa lesões nos músculos e nos
ossos. No final do treino, estamos estragados. O bom é o que acontece
daí em diante. Para se recuperar do estrago, o corpo vai buscar nos seus
estoques novos substratos energéticos e outros nutrientes para pôr no
lugar dos que foram gastos. As lesões são consertadas, as substâncias
tóxicas são tiradas de campo. Horas depois, está tudo muito melhor do
que antes. Claro, desde que alimentação em repouso estejam em dia.
Essa
recuperação pode ser mais rápida ou mais demorada, dependendo do
tamanho do estrago e do estado dos nossos estoques. Se eu estou
acostumada a correr quatro quilômetros na esteira e num domingo qualquer
resolvo participar de uma prova de dez quilômetros, eu certamente não
estarei tinindo de nova na segunda de manhã. Minha recuperação, nesse
caso, será mais lenta. Lá pela quarta-feira, talvez, eu esteja com pique
pra fazer minha série de sempre.
Segundo Pavalelli,
depois de um dia exaustivo como o que eu tive esta semana, meu corpo
está quase tão acabado quanto se eu tivesse corrido os dez quilômetros.
Não acabado do mesmo jeito, mas igualmente precisando de um repouso mais
longo para retomar o pique de sempre. Homens gostam de comparar gente
com carros. Então, na analogia do Pavanelli, o estresse da ponte aérea
me deixou mais ou menos como um carro com tanque cheio pela metade e com
gasolina adulterada.
Isso signfica que fiz bem em não
pular da cama às 7h ou às 8h para malhar. Mas o conselho do fisiologista
foi que eu não deixasse de fazer algum exercício naquele dia. O ideal,
disse ele, seria fazer alguma coisa mais leve do que o usual. Dar
preferência a um exercício aeróbio em vez do levantamento de pesos, e
também um alongamento. Afinal, meu corpo estava precisando relaxar. Em
vez de acrescentar estresse a ele com um esforço intenso antes de ele se
recuperar totalmente, eu deveria ajudá-lo a alcançar de novo seu grau
normal de disposição, para então poder exigir dele tudo de que ele
normalmente é capaz. Quando meu corpo se sentisse de novo como um carro
abastecido com gasolina de boa qualidade, eu poderia acordar cedo para
pegar pesado.
No meio esportivo, o nível de desgaste
fisiológico do corpo costuma ser medido numa gota de sangue colhida no
dia seguinte a uma competição. Mas entre praticantes comuns de atividade
física, o método mais indicado é a tabela de percepção de esforço de
Borg, criada em 1966 (e aprimorada posteriormente). Borg foi um cara que
entendeu que, à medida que a gente faz mais esforço, a tensão
fisiológica aumenta. Esse esforço é percebido e declarado pelo
praticante na forma de sensação de tensão, dor, fadiga na musculatura
envolvida, respiração ofegante e até aversão a tarefa. É um método
subjetivo, baseado no que cada praticante sente durante o exercício, mas
não menos efetivo. É muito usado nas avaliações físicas de academia e
ajuda a monitorar a evolução dos resultados.
A tabela
abaixo mostra os valores estipulados por Borg para medir o grau de
esforço percebido durante o exercício. O número 6 equivale a uma
freqüência cardíaca de aproximadamente 60 bpm (repouso) e o 20 se refere
à sensação máxima absoluta – que nem todo mundo alcança.
Acho que costumo ficar
no grau 13 nas minhas séries na musculação. Quando corro, oscilo entre o
11 e o 13 – só quando meu professor pega no meu pé é que experimento
correr até o 15. A última dica do Pavanelli foi que eu procure sempre
manter meu nível de esforço. No dia em que estiver mais cansada, devo
pegar mais leve para me esforçar no mesmo grau, não mais do que sempre.
Ainda não sei qual carga pegar para isso, mas me parece que só
experimentando para saber. Mantendo em mente que, entre descansar e
treinar, a melhor opção é respeitar meu corpo.
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