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Já faz algum tempo que as cantinas escolares são alvo de atenção pelo tipo de alimento que oferecem às crianças. Hambúrgueres, refrigerante, salgadinhos Elma Chips, balas, cachorros-quentes. Felizmente alguém se tocou de que isso não é comida que se dê sem limites a quem está em fase de crescimento, especialmente crescimento para os lados. E começaram a surgir militantes do lanche saudável nas escolas. No Brasil, colégios particulares têm se esmerado em estratégias educativas e proibitivas para evitar que seus alunos comprem entre as aulas ou levem na lancheira qualquer item que exceda demais as recomendações nutricionais para a idade deles. Nas escolas públicas a coisa vai mais devagar. Justamente porque esbarra na lista de compras do governo, que sempre tem verba limitada e requer licitações antecipadas para compras no atacado.
Em setembro, a Folha noticiou que a prefeitura de São Paulo cedeu a um pedido da Nestlé para que fosse aceito numa dessas licitações um produto inadequado para a alimentação infantil. Segundo as normas da competição, as empresas concorrentes deveriam oferecer uma sopa desidratada que contivesse uma determinada proporção de ingredientes. Segundo o jornal, a vontade da Nestlé era participar da licitação mesmo tendo uma sopa com muito menos carne do que o exigido. E o prefeito Kasasb aceitou.
Lá no país que nos serve de referência para quase tudo, os problemas são outros. Ali não falta dinheiro e a merenda é farta, até porque as escolas fazem parcerias com empresas de alimentos. Conforme conta a nutricionista Marion Nestle em seu livro Food Politics, tornou-se comum colocarem aquelas máquinas com todo tipo de junk food para os alunos comprarem à vontade e imprimirem propaganda de lanchonete em capa de caderno. As escolas públicas de lá recebem do governo remessas fartas de alimentos industrializados cheios de derivados do milho, principalmente o famoso adoçante concentrado de frutose, base de todo refrigerante. Resultado: estudantes gordinhos e obesos por toda parte, com problemas de diabetes e risco alto para doenças cardiovasculares no futuro.
Esta semana, o Senado americano apresentou a proposta de banir toda essa porcariada das escolas. Eles pretendem estabelecer um limite de calorias, açúcar e sal para os alimentos adquiridos fora do programa governamental de merenda escolar. Se aprovadas, as medidas devem passar a valer só a partir de 2011. Marion Nestle (não, ela não tem nada a ver com a Nestlé) me escreveu de lá dizendo que o senador Harkin pensa estar dando o passo máximo em direção à merenda saudável, mas não é bem por aí. “De um ponto de vista estritamente pragmático, vale a pena sustentar a tese dele, pois isso vai tirar a pior comida da maior parte das escolas. Mas não acho uma boa idéia usar parâmetros nutricionais para determinar o que entra e o que sai”, me disse Marion. “As indústrias irão simplesmente formular produtos que se encaixem nas notas de corte”, ela deduz. A sugestão dela é que o governo simplesmente proíba a compra de produtos competitivos e elimine completamente as máquinas de salgadinhos.
Uma das grandes defensoras do cardápio saudável nas escolas americanas a “tia da cantina regenada” Ann Cooper. Ela tem um blog só sobre isso. Transtornada com as notícias mais recentes na imprensa de lá sobre alimentos e o gosto das crianças, ela levanta a hipótese óbvia: “Será que essa tese de que as crianças não iriam comer comida saudável vem da certeza de que, se comessem montanhas de frutas frescas, verduras e alimentos integrais as corporações perderiam lucro? Hmmmm...”
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