1 de out. de 2009

Esse treino é só para atleta?

Na coluna do dia 26 de agosto, escrevi sobre os exercícios pliométricos que eu faria durante um mês na academia do Grupo Pão de Açúcar, proposto pelo educador físico Irineu Loturco. Minha intenção era conhecer novas maneiras de fortalecer músculos e ossos e assim adiar o processo de envelhecimento. A de Loturco era me mostrar que o tipo de força que eu desenvolveria ali me tornaria não só forte, mas também mais rápida e protegida contra fraturas e outras lesões. O treinamento começou naquela mesma semana e terminou na semana passada, com um total de 12 sessões. Chegou a hora de contar como foi e o que eu ganhei com isso.

No dia 24 de agosto, uma segunda-feira, algumas de minhas capacidades físicas foram medidas com a ajuda de equipamentos. Foram quatro testes. No primeiro, eu deveria correr 15 metros, o mais rápido que pudesse. Devo dizer que não tinha noção da postura correta para largar nem correr, pois nunca treinei para correr em velocidade. Depois das gincanas de que participei na infância, acho que nunca mais apostei corrida. Era um experimento sem nenhum resultado esperado, portanto. Ninguém ali, nem eu nem o treinador, podia prever como eu iria correr. Mas a proposta era avaliar meu estágio inicial, fosse qual fosse.

Depois de um aquecimento específico de dez minutos, com trote, saltitos e variações do mesmo tema, estava pronta para o possível vexame. Dois sensores iguais aos usados nos jogos olímpicos, instalados num corredor dentro do prédio onde fica a academia, captariam o momento da partida e da chegada. Me posicionei e larguei. Acho que repeti o tiro três vezes. E minha maior velocidade, registrada pelo computador portátil conectado aos sensores, foi de 5,5 metros por segundo.

Na última sexta-feira, 25 de setembro, repeti o teste. E consegui correr a 6,5 metros por segundo, uma velocidade 18% maior que a primeira. Ao que parece, fiquei mais rápida.

O segundo teste foi de impulsão vertical. Eu tinha de parar de pé em cima de uma espécie de tapete com sensores e saltar o mais alto que pudesse, sem sair do lugar e sem tirar as mãos da cintura. Meu impulso viria de um curto agachamento. O computador registraria o tempo em que eu ficaria fora do tapete e calcularia a altura do salto. No primeiro teste, meu melhor salto foi a 27 centímetros do chão. Um mês depois, subiu para 31,5 centímetros -- um ganho de 17%.

Meu treinador achou que melhorei bastante. E houve vários motivos para isso.

O primeiro deles é minha genética. Ela provavelmente favorece um ganho rápido de certas qualidades físicas. Outro motivo pode ter sido minha alimentação. A nutricionista do Pão de Açúcar me pediu para comer mais do que estava acostumada (especialmente fontes de carboidratos complexos, como pão e arroz), pois assim haveria mais nutrientes disponíveis para aumentar a massa muscular. Com isso, ganhei um quilo - o que, para mim, faz bem. Também me pediram para, ao longo do mês todo, dormir bem, beber pouco ou nenhum álcool e não realizar exercícios concorrentes (ou seja, minha musculação normal foi interrompida nesse período). Outro fator que deve ter contribuído para esses resultados foi minha disciplina ao cumprir todas as atividades propostas, sem faltas e sem preguiça.

E, claro, houve o treinamento.

Durante esse mês todo, Loturco programou minhas aulas como se eu fosse uma atleta e tivesse uma competição no final. Ele queria que eu ganhasse principalmente potência para correr rápido e saltar. A gente sempre começava com os exercícios educativos (logo após o aquecimento na esteira), que me ensinavam a correr direito. Na esteira e depois no chão, eu fazia skipping baixo (melhor que eu tentar descrever é você ver uma demonstração aleatória no You Tube) e skipping alto (parecido, mas os joelhos sobem mais). Na esteira, também fazia uma corrida rápida (comecei com uns 14 no primeiro dia e nos últimos cheguei a 20 quilômetros por hora) que começava com ela já em movimento.


Havia um caixote no meio do caminho: pliometria

Depois vinha a tal da pliometria.

Havia um caixote no meio do caminho. Era eu, o chão e um "caixote" vazado de metal de 15 centímetros de altura. Eu tinha de saltar do chão para cima do caixote, pisando com os dois pés ao mesmo tempo, amortecendo a queda com um agachamento e mantendo os pés afastados na largura do quadril. Ok, aprendi. No terceiro dia, já estava craque. Aí me puseram um segundo caixote, com o dobro da altura. Eu tinha de passar do primeiro caixote para o chão e do chão saltar para o segundo. Essa etapa requereu um pouco mais de concentração, e eu errei várias repetições. Quando melhorei, me puseram um terceiro caixote, ainda mais alto. Sim, eu tinha de saltar do chão para o caixote mais alto logo depois de descer dos outros dois. E o incrível foi que, de repente, saltar para o segundo caixote ficou muito fácil. Eu já nem me sentia saltando, mas dando um passo.

Na verdade houve um percalço nessa etapa. O primeiro salto para o caixote maior me rendeu uma dor na lombar. Embora eu estivesse fazendo na musculação um exercício de fortalecimento dessa musculatura, aparentemente ele não estava sendo suficiente para me proteger em movimentos mais ousados como aquele. Nas duas semanas seguintes, precisei ter mais cuidado durante o treino, com especial atenção para a contração abdominal durante todos os exercícios. E tudo correu bem.


Depois da pliometria nos caixotes, eu passava para uma máquina conhecida como Smith ou barra guiada. É uma máquina alta em que uma barra de ferro fica presa a uma estrutura fixa e desliza para cima e para baixo, seguindo o comando do corpo. Ali eu fazia agachamentos (flexão e extensão dos joelhos com a barra nas costas) e supinos (deitada com as costas apoiadas num banco, erguia a barra com as mãos, usando a força do peitoral). Agachamento e supino são exercícios muito usados na musculação. Conforme o objetivo e a condição física de cada pessoa, usa-se um determinado número de repetições e uma carga (anilhas de ferro adicionadas à barra) compatível. O meu objetivo ali, estabelecido por Loturco, era desenvolver potência. Ou seja, ele queria que, ao final das 12 sessões, eu conseguisse erguer uma carga maior do que a inicial e numa velocidade também maior.

Loturco sempre usava as leis da física para me explicar sua técnica. E eu tinha de me lembrar das aulas do colégio. "Força é massa vezes aceleração, certo? Se você aumenta a massa, tem de reduzir a aceleração." Ele queria dizer que, toda vez que a gente aumenta a carga, inevitavelmente executa o movimento mais lentamente. Eu sei disso não porque entendo de física, mas porque sinto o peso da barra e não aguento erguê-la mais rapidamente. Mas aí ele reduzia um pouco a carga e me pedia para fazer o movimento com rapidez. O mais rápido que eu pudesse. Era o outro lado da lei da física: quanto menor a massa, maior a aceleração.

O que ele queria era que eu conseguisse acelerar o movimento mesmo quando ele aumentasse a carga. Isso demandava mais força. Ele aumentava a carga pouco a pouco, a cada série. Os intervalos eram grandes, de pelo menos dois minutos, para que eu me recuperasse bem. Assim, de um dia de treino para o outro, eu estava de fato levantando mais e mais carga, com velocidade. No agachamento, comecei com uma carga máxima de 47 quilos e terminei com 54,5 quilos (levando em conta o peso da barra mais as anilhas). No supino, passei de 34,5 quilos para 42,8 quilos.

As cargas e o número de repetições eram determinados pelo meu progresso. Em algumas sessões de treino, esses dados eram registrados por um software que calculava minha potência em cada repetição. Um gráfico podia ser gerado imediatamente após cada série, já nos mostrando como eu melhorava de uma série para outra. Quando minha potência começava a cair, o professor mandava parar e descansar. Parecia tudo muito preciso. Segundo Loturco, limitar o exercício ao número de repetições que a gente aguenta fazer com velocidade ajuda a ganhar força mais rápido do que relizar mais movimentos com mais cansaço.

Foi a primeira vez que eu treinei com professor particular. Sem esse monitoramento constante do profissional, que podia observar meu desempenho minuto a minuto, me parece que a mudança nas cargas e no número de repetições seria mais improvisada. E, sem os números gerados pelo computador, não saberíamos tão exatamente quais os meus ganhos.

Na última semana de treino, Loturco fez uma alteração considerável nesse desafio. Em vez de apenas erguer a barra (com a força dos glúteos e membros inferiores no caso do agachamento e com o peitoral no caso do supino) rapidamente, eu deveria lançá-la para o alto, sem freá-la, deixando que ela voltasse à posição inicial apenas pela ação da gravidade. No agachamento, isso significava saltar para cima e tirar os pés do chão com a barra pesada nas costas. No supino, eu soltava as mãos da barra ao estender os cotovelos e a recebia de volta, amortecendo a queda com a flexão dos cotovelos. Esse lançar da barra sem freio servia para eu usar uma aceleração ainda maior com a carga pesada.

Dava um pouco de medo do impacto a que eu estava submetendo minhas articulações. Eu tinha de prender muito o abdome, sempre, e flexionar joelhos e cotovelos numa medida segura. Impacto pode ser bom ou ruim, depende do quanto o corpo está preparado para recebê-lo. De pouquinho em pouquinho, o impacto causa pequenas (e bem-vindas) lesões nos músculos e ossos e induz o organismo a "remendar" essas microlesões com mais massa muscular e óssea. É assim que músculos e ossos se fortalecem. Mas, quando o impacto é demais, pode acontecer uma lesão não bem-vinda, como a que virou dor na minha lombar por quase duas semanas. Pode ser que mais saltos sejam bem-vindos no meu dia a dia, para que eu ganhe mais densidade muscular e óssea. Mas já aprendi que, para isso, precisarei caprichar mais no fortalecimento de músculos protetores das articulações mais vulneráveis, como joelhos e coluna.

De acordo com os dados no notebook, Loturco me disse que eu passei de 164 watts de potência no agachamento na primeira semana para 210 watts no teste final (aumento de 28%), e de 132 watts para 182 watts no supino (aumento de 38%). Com esses resultados, disse ele, eu poderia me considerar mais preparada para competir numa prova esportiva, como por exemplo uma corrida de cem metros. Caso eu fosse uma atleta.

Perguntei se era possível que alguém não melhorasse em nada com um treinamento desse. A resposta foi que sempre há um ganho. Segundo Loturco, os meus resultados até passaram um pouco a média que estudos com atletas mostraram. Não por ter mais aptidão. Ele desconfia que o motivo seja justamente o fato de eu não ser atleta. Porque estímulos novos num corpo destreinado geram resultados rápidos mesmo, mais do que em corpos treinados. Ele me disse que, se eu fosse uma gordinha sedentária, seria muito mais fácil apresentar ganhos de força. Mas, como eu já fazia exercícios de força antes, melhorar minha musculatura era um desafio maior.

A olho nu, eu não diria que mudei. A fita métrica e a balança mostraram um pequeno ganho de peso e de centímetros, principalmente nas coxas, mas também na cintura, o que me leva a crer que a dieta de comer pra caramba deu resultado. Também não vou aproveitar a potência que ganhei, porque não pratico nenhum esporte que requeira potência. Mas gostei do experimento. Gostei de saber que meu corpo pode ganhar qualidades rapidamente, se eu usar os estímulos certos. Gostei de saber que posso saltar e talvez apostar corrida com chances de ganhar, dependendo do adversário. Ainda ter muito que aprender sobre si mesmo é uma certeza confortante.

(Originalmente publicado em www.epoca.com.br)

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