Será que a malhação é mesmo a melhor maneira de aprender a se mexer?
Como eu vivo repetindo aqui, sou uma
frequentadora de academias de ginástica de longa data. Mas, em alguns
aspectos, ainda me considero uma iniciante. E isso me preocupa. Não que
eu ache que deveria saber tudo e executar todos os movimentos
perfeitamente. Mas me parece que pelo menos os movimentos mais adequados
para o meu corpo eu deveria conhecer, sim. Todo mundo deveria saber
isso de si mesmo. Por que não nos ensinam?
Algumas semanas atrás, abordei nesta coluna o jeito certo de fazer alongamento.
Quando entrevistei a professora e ela me mostrou, no meu corpo, em que
eu andava errando, me surpreendi. Como assim, depois de tanto tempo
praticando, eu não conhecia os movimentos certos? Por que não haviam me
ensinado a alongar daquela forma desde o começo, 17 anos atrás, e
repetidamente ao longo desses anos todos?
Mais
questionamentos se sucederam. Recentemente, descobri uma lesão nos
joelhos. Sinto dor quase diariamente. O médico me disse que era
inevitável não ter nenhum problema nas articulações com tanta atividade
física. Como? Mas nem sou atleta. Sempre me exercitei visando a saúde,
qualidade de vida, manutenção da musculatura... Alguma coisa eu devo ter
feito de errado. Será que peguei peso demais em algum período? Será que
foram aqueles dez quilômetros que corri sem preparo, incentivada por
gente da academia, dez anos atrás?
Na semana
passada, resolvi experimentar uma aula de ginástica relativamente nova.
Eu fiz muita ginástica até os vinte e poucos anos, depois larguei e
fiquei só na musculação. Perdi o costume e estranho muito quando volto à
sala de aula e me submeto àquela espécie de macaquice do professor.
Bem, a aula era mais ou menos coreografada. Três vezes por semana, a
mesma aula, igualzinha. Os alunos fazendo o mesmo exercício ao mesmo
tempo, só variando a intensidade conforme a resistência de cada um. E eu
era uma novata. Tive aquela sensação desconfortável que desconfio que
todo novato tem na primeira aula de qualquer coisa. Não conhecia os
movimentos, não sabia o jeito certo de posicionar o corpo, não sabia
direito a carga que deveria usar. O professor me dava instruções, mas
ele não podia parar a aula para me mostrar tudo com calma. Eu deveria
pegar o ritmo com o tempo.
Congelemos
essa cena. Ponha-se no meu lugar um novato ainda mais novato, alguém que
esteja chegando agora ao mundo do suor, que não tenha muita noção ainda
de onde está ou como contrair sua musculatura abdominal. Ele estará bem
mais perdido do que eu. Ele estará tentando flexionar os dois cotovelos
para trabalhar o peitoral, mas estará se esquecendo de ajeitar o
quadril e os pés e sua coluna estará torta. É preciso pegar o ritmo da
aula, porque a aula é assim, coletiva e ágil. Ele quer fazer essa aula
porque quer entrar em forma... rápido.
Como
estará esse cidadão hipotético daqui a um ano? Terá ele aprendido a
posicionar sua coluna vertebral? Ou daqui a 17 anos vai machucar a
lombar porque ainda não consegue contrair corretamente a musculatura
abdominal na hora de carregar peso?
Minha
questão central é até que ponto as aulas coletivas de ginástica,
ministradas nesse ritmo coreografado muito comum hoje em dia, são um bom
começo. Fiquei com a impressão de que não são. No meu ver, elas
favorecem os vícios de movimento e deixam de lado a verdadeira educação
física – aquela que se propõe a ensinar o que cada pessoa pode e deve
fazer com seu corpo em nome da saúde e do bem-estar.
Imagino que quem chega à academia depois de um longo período de
sedentarismo está com o corpo analfabeto. Precisa aprender o be-a-bá de
si mesmo para começar a sair do lugar. Perceber, passo a passo, de qual
trabalho é capaz cada pedaço do seu corpo e qual deve ser o caminho do
aprendizado para avançar na performance com segurança. Sem isso, o que
acontece é que multidões de pessoas que só enxergam o final do percurso –
a boa forma – se jogam em ginásticas e corridas que fazem suar mas não
educam os movimentos individuais.
Segundo minha
observação, sem qualquer respaldo científico, o percurso usual do
malhador é que ele comece na ginástica coletiva e vá refinando seu
interesse e seu entendimento até, depois de alguns anos, optar por um
treinamento individualizado, que respeite suas características, atenda a
suas necessidades e corrija os problemas músculo-articulares
adquiridos. Desconfio que inverter essa ordem seria mais interessante
para quem quer ser ativo a vida toda, sem dores.
(Originalmente publicado em www.epoca.com.br)
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