10 de ago. de 2011

Desisti da avaliação física


Não preciso me expor tanto para saber de que tipo de treino eu preciso

A academia que me desculpe, mas desisti da avaliação física. Não vou. Quer dizer, vou. Vou para treinar, não pra ser exposta, medida e comparada com uma versão mais jovem e gostosa de mim mesma. Eu já sei quais são meus defeitos atuais, não preciso de ninguém registrando isso no papel.

A primeira vez em que mediram minhas dobras cutâneas, há 19 anos (é, o tempo passa...), havia justificativa suficiente para isso, eu acho. Eu era visivelmente magra, mas não sabíamos quanto daquela magreza era feita de músculos ou de gordura. E eu tinha, descobri, mais gordura do que podia supor, apenas olhando para o espelho: 18%, por aí (o que ainda é pouco, eu sei). O avaliador me disse, na época, que eu precisava aumentar minha massa magra, sem necessariamente aumentar meu peso. Como o que eu queria fazer era ginástica localizada, me encaixei nos horários das aulas e pronto. O aumento da massa magra seria o que a ginástica pudesse me proporcionar.

Várias avaliações físicas depois, já consigo prever quais serão meus resultados e as recomendações do avaliador. Até porque não estou sedentária e sei muito bem quanta força sou capaz de fazer ou quanto fôlego eu tenho nas atividades físicas extenuantes que costumo praticar. Sei também coisas que a avaliação não procura saber, como a quantas andam meu equilíbrio e minha coordenação motora, minha facilidade de saltar rápido, a qualidade do meu sono, a diferença de pique que sinto de manhã e à noite, quais exercícios são mais fáceis e quais são mais difíceis para mim, o quanto mais rápida eu gostaria de ser, o tipo de gente e o tipo de música com que eu gosto de treinar, o tédio ou a irritação que me dá ficar esperando o colega desocupar um aparelho da musculação. Em suma, há poucas coisas que esse tipo de avaliação física pode me revelar e que eu realmente queira saber.

'Ah, mas o objetivo da avaliação é fornecer informações ao professor, para que ele possa montar meu programa de exercícios de acordo com minhas necessidades', alguém pode dizer. Bobagem. Na prática, se eu deixar, eles verão que meu corpo longilíneo merece mais músculos e vão me propor trocentas séries de 8 a 12 repetições na musculação, esperando que eu tenha todo o tempo e a paciência do mundo para gastar entre os aparelhos. Exatamente como fazem com todo mundo que deseje aumentar pelo menos um pouco a massa magra.

Mas, depois de passar por isso algumas vezes, ao longo de dez anos dedicados às séries de 8 a 12 repetições na musculação, eu já não tenho paciência para essa conversa. Resolvi pular algumas etapas e definir com meus próprios botões o que eu espero do treino novo, a partir do que já sei sobre meu corpo.

- Continuo magra, com um percentual de gordura baixo o bastante para uma mulher da minha idade, e continuarei magra enquanto continuar me alimentando como me alimento e produzindo hormônios normalmente. No máximo, esse percentual vai subir ou descer um, dois ou três pontos. Já sei que isso não vai mudar muito nos próximos anos, a não ser que algo muito diferente aconteça. Como uma gravidez, por exemplo. Mas quando meu percentual de gordura aumentar mais que três pontos eu certamente vou perceber apertando eu mesma minha pele. Não preciso de avaliador nem de aparelhinho pra isso.

- Minha capacidade cardiorrespiratória tem sido classificada como muito boa ou excelente há alguns anos. E, com base no tipo de treino que andei fazendo nos últimos 11 meses, posso adivinhar que ela melhorou. Não tenho, portanto, por que me preocupar com ela. É só manter. Muito menos tenho motivo para perder meu tempo numa bicicleta ergométrica desconfortável.

- Minha flexibilidade é bastante boa comparada à dos meus colegas de treino, e isso eu sei não porque ficamos comparando desempenhos no alongamento, mas porque eu agacho com facilidade, inclusive com uma perna só, mantendo a postura correta. É no treino que a gente observa essas coisas. Não preciso de uma régua pra isso.

- Minhas circunferências foram medidas em casa ontem à noite, com minha própria fita métrica, e eu já sei quantos centímetros perdi ou ganhei em cada parte do corpo. Não preciso me expor com shortinho curto e me deixar tocar por um desconhecido para saber que minha coxa diminuiu. Aliás, isso eu já tinha percebido há tempos na hora de me vestir, na frente do espelho. Também já sei que meu tônus muscular já foi melhor do que está hoje, e é por isso que quero voltar a fazer certos exercícios que eu tinha parado de fazer.

Se eu estivesse bem pior do que estou (com percentual de gordura alto, flacidez, baixa capacidade cardiorrespiratória), a avaliação física talvez servisse para terminar de destruir minha autoestima e acrescentar argumentos aos que eu já tivesse acumulado em favor de uma rotina mais caprichada de exercícios. Como sei que estou bem, mas nem tanto quanto já estive, em alguns aspectos, posso prever que um dos meus objetivos com o treino deve ser manter o que já conquistei e recuperar o que de bom eu perdi. Quem é que sabe como foi que eu conquistei o que tenho hoje e como foi que eu perdi o que já tive? Sou eu que sei. Fui eu que treinei, fui eu que suei, fui eu que senti as dores e os prazeres, fui eu que aprendi com os professores que me ensinaram. Então eu sei como melhorar daqui para frente.

O que eu não sei é montar programas de exercícios, planejar a progressão e a periodização, prever quão rapidamente eu posso conquistar melhores resultados, avaliar se minha técnica de execução está perfeita. Para isso, sim, eu ainda preciso de um profissional. Então, em vez de avaliação física, vou é ter uma boa conversa com o professor que melhor puder fazer por mim o que eu não sei. Enquanto não descubro quem é essa pessoa, estou consultando vários, testando treinos e avaliando quem sabe mais sobre o que eu quero fazer. Afinal, não é só a academia que tem de saber como extrair o melhor dos alunos. Os alunos também precisam saber como extrair o melhor da academia.




14 comentários:

Anônimo disse...

SENSACIONAL !
ATÉ QUE ENFIM alguém tomou coragem para criticar aspectos desagradáveis sobre o modo como o processo de avaliação física é conduzido na maioria das academias!!

Parabéns minha amiga!

gforce disse...

Conheça-te a ti mesmo e conhecerá o Universo.
Conheça-te a ti mesma e nem de professor precisará.
Sugira à sua academia incluir os aspectos que mencionou. O protocolo trivial está adequado dentro do limite proposto.
Vc é quem está além da média e quer algo realmente novo. Vai nessa, pois tem gente tirando leite de pedra.

Andrea disse...

ADOREI!!!
Sou personal e acho que essas avaliações acabam com a autoestima dos alunos e muitas vezes acabam frutrando-os!!

Parabéns pelo texto...

Bruna Oliveira disse...

Eu como avaliadora física, professora de educação física, entristesso-me pela falta de conhecimento e informação que é passado para os alunos a respeito da avaliação física. Quando BEM FEITA e BEM APLICADA se torna um fator INDISPENSÁVEL para o alvance do objetivo do aluno. Talvez seja até "compreensivel" (porém não justificavel) o descaso por alguém que vise somente a estética dando ênfase para percentual de gordura e circunferências como é descrito no texto. Porém a valiação vai MUITO além disso. Por exemplo: existem restrições na execução de alguns exercícios que são observadas a partir da avaliação postural. Talvez a autora do texto nunca tenha encontrado uma academia e um professor que realmente mostrassem a ela a importância e a verdadeira e CORRETA aplicação da avaliação física.

Unknown disse...

Nossa acho que vou contratar alguém assim para ministrar um curso,para me deixar atualizado, já que avaliação física se resume somente à isto, preciso mudar meus conhecimentos, e também viu esquecer os outros tipos de avaliações, já que a postural, biomecânica, cinésiologica pelo jeito não servem para nada também! Ainda bem que são poucos que pensam assim!

Francine Lima disse...

Acertou, Bruna. Nunca treinei numa academia que fizesse questão de avaliar outras coisas, como a postura em movimento, e não só a estática. Também não me lembro de ter feito uma avaliação que fosse mais importante que o acompanhamento do professor para descobrir o que estava faltando no meu treino. E eu não disse que ninguém nunca deveria passar por uma avaliação. Eu só disse que, tendo feito várias e conhecendo o meu corpo bastante, as avaliações estéticas anteriores são suficientes, por enquanto, como parâmetro.

Joel Fridman disse...

Então talvez o que falte é a avaliação pelo movimento em si, e não por medidas corporais para se comparar com tabelas.
Acho justificável existir avaliação, porém não indispensável. Existem pessoas que PRECISAM de um objetivo a ser alcançado, como pessoas que sabe o que NÃO comer mas mesmo assim só fazem isso ao ir a um nutricionista.
Enfim, Fran, meio-a-meio é minha opinião (para variar), você tem razão no seu ponto de vista, mas não pode descartar alguns benefícios daquela avaliação básica.
Feita melhor, ou de outra maneira... u-hu... aí sim chegamos onde cada indivíduo precisa de afago.
PS: gostei da parte do "treino dos últimos 11 meses" ter deixado você bem no cardio-respiratório.

Francine Lima disse...

Oh, yeah, Joel e Fê. Avaliação de movimento é outra história. Quantas academias fazem?

Anônimo disse...

Nossa!!! Quanto bobeira nesta matéria.

Tiago Tadeu disse...

Olá Francine,

Legal a matéria! Concordo em parte, só não acho legal a questão que comentas sobre "estar de shortinho e se deixar tocar por um desconhecido". Acho que antes de fazer tua avaliação física, deves saber com QUEM estás fazendo. Parte-se do príncípio que vais escolher um profissional com formação pra tal e nesse caso não vejo exposição alguma e muito menos o fato de ser tocada. Acho que o profissionalismo está acima disso.
Um abraço.

Francine Lima disse...

Ué, Tiago. A academia não me pergunta se eu prefiro fazer a avaliação com um homem ou uma mulher. Por mais profissional que a pessoa possa ser, eu tenho o direito de me sentir incomodada, certo? Não estou dizendo que toda mulher precisa se incomodar com isso. Claro que não. Também não estou dizendo que ninguém deve fazer avaliação física. Minha mensagem foi: quando meu objetivo já não é meramente esculpir minha silhueta, esse modelo de avaliação física baseado na estética é mais supérfluo do que útil.

Malu Schroeder disse...

Sou avaliadora física, professora de educação física e pilates,pós graduanda em fisiologia do exercício, e julgo esse seu descurso uma simples falta de conhecimento e informação a cerca do assunto. A avaliação não tem finalidade estética, e questões importantes são muitas vezes detectadas através desta simples estratégia de acompanhamento, meu trabalho não é julgar se o meu aluno esta gordo ou magro, mas sim mostrar a ele que os seus valores podem estar fora de padrões considerados desejáveis para manutenção da SAÚDE, como por exemplo o ICQ (índice cintura quadril),que esta fortemente relacionado a problemas cardiovasculares,voce não deixaria de fazer um exame lipidograma por exemplo, se nele constasse que seu colesterol esta acima do ideal, deixaria?,porque são os meios que seu médico tem para te dar um bom acompanhamento.Para mim o seu texto não passa de uma falta de respeito pela profissão. Já que vc gosta tanto do tema, leia algum artigo ciêntifico sobre o tema, antes de julga-la como algo inútil.

Francine Lima disse...

Oi, Malu. Bem-vinda ao blog.
Como já procurei esclarecer em comentários anteriores (acredito que você não tenha lido), eu em nenhum momento preguei que todas as pessoas desistam da avaliação física. Eu descrevi as minhas características e o meu histórico e declarei que, no meu atual estágio de treino, conforme o meu estado 100% particular de saúde (sem nenhum risco para doenças crônicas, certo?) não acho que o modelo de avaliação física que as academias costumam fazer me sirva de muita coisa. Eu nem usei verbos no imperativo, veja bem. Isto é um blog escrito em primeira pessoa feito para as pessoas pensarem, não para seguirem acriticamente o que eu faço. Combinado?

Unknown disse...

Olá, Francine. Tudo bem?
Entendo o seu artigo como uma reflexão importante, quanto à preocupação excessiva das academias com a parte estética e a baixa qualificação para a chamada avaliação.
Mas, consigo ver na sua fala que acha a avaliação importante, apesar de em muitos momentos criticá-la, principalmente na análise estética que ela pode se configurar.
Como docente universitário e ex gerente técnico de academias, eu proponho a escolha e a divisão da avaliação pelo aluno, onde ele pode optar por:
1) risco coronoariano (anamnese)
2) avaliação da composição corporal
3) avaliação postural
4) avaliação física
5) avaliação completa (todas as anteriores)
6) nenhuma avaliação (com assinatura do termo de responsabilidade sobre sua saúde e/ou apresentação de atestado médico de um cardiologista, ou fisiologista do exercício).

Na minha humilde opinião, o principal problema é a pós avaliação, pois os profissionais que vão trabalhar com o aluno avaliado não sabem usar (quando usam) a avaliação e a reavaliação como eixo norteador do treinamento, desmerecendo completamente sua validade.
Parabéns por levantar essa crítica e toda a discussão é saudável.
Aquele abraço,
Pedro Paes
Professor de Educação Física